sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Sexta Feira Bagaceira: Carl Douglas


Bruce Lee fez a cabeça da molecada americana nos anos 70. Filmes como A Fúria do Dragão, O Voo do Dragão e O Dragão Ataca, se pecavam pela falta de variedade temática, elevaram Lee à condição de ícone cultural e popularizaram definitivamente películas dedicadas às artes marciais, deixando um legado absorvido por artistas tão díspares quanto Wu-Tang Clan e Quentin Tarantino.

Foi nessa onda que embarcou o jamaicano Carlton George Douglas. "Kung Fu Fighting" deveria, originalmente, apenas preencher o lado B do single "I Want to Give You My Everything", mas após ter sido gravada (em menos de uma hora e apenas dois takes), um executivo da gravadora insistiu para que a faixa fosse prensada no lado A. Sábia decisão: lançado em 1974, o single vendeu mais de onze milhões de cópias. Produzida pelo subestimado indiano Biddu (Tina Charles, The Flirtations), "Kung Fu Fighting" tem um riff de flauta oriental clássico, entre vários "huh! hah!", representando foneticamente os movimentos da luta. Carl Douglas cantava bem demais, mas lustrava a cara de pau e mandava ver na performance metido nesse ifu (roupa para a prática do kung fu) do vídeo abaixo. Foi um hit só, mas lá em 1974, everybody was kung fu fighting.

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Sexta Feira Bagaceira: Stevie B


O Rei do Freestyle chegou ao topo do paradão da Billboard em 1990 com a baba "Because I Love You (The Postman Song)", mas sua música mais conhecida é "Spring Love", lançada dois anos antes - ao menos no Brasil, onde foi megahit de pistas e rádios. Pode colocar boa parcela da culpa em Stevie B pelo fenômeno do funk melody ter se propagado por aqui (ele tem um single que batizou esse subgênero do funk carioca, inclusive), de onde saiu gente um tanto duvidosa, como Latino e Copacabana Beat e também um povo comprovadamente talentoso (Claudinho & Buchecha). "Spring Love" é a canção freestyle por excelência: percussão latina, gancho forte de sintetizador, vocais dramáticos e linha de baixo adiposa correndo juntinho com o bumbo. Acha melosa? Bobagem. Stevie B é um ótimo cantor de R&B e os arranjos de voz dessa faixa (especialmente quando entram os backing vocals), são irrepreensíveis. Pra saudar a chegada da Primavera, uma óbvia (e ótima) pedida.

"Spring Love (Come Back to Me)": o cabelo está bem melhor agora.

domingo, 17 de setembro de 2017

It's The Remix About Me


Era de se esperar que o recém-lançado "You're the Best Thing About Me" (primeiro single do próximo álbum do U2, Songs of Experience), viesse acompanhado de uma batelada de remixes, oficiais ou não. Primeiro que faz bastante tempo que a relação do U2 com as pistas de dança é bem íntima, segundo que a banda irlandesa parece não querer perder o trem da história. Pra isso, convocou o galã norueguês (produtor e DJ nas horas vagas) Kygo para adequar a canção ao gosto dos frequentadores das Tomorrowland da vida. Kygo, fora suas duvidosas produções de dance, acumula as façanhas de ter ultrapassado a marca de um bilhão de views de sua * cof cof * música no Youtube e Soundcloud somados e ter sido o primeiro produtor de house music a se apresentar numa cerimônia de encerramento de uma Olimpíada (no Rio, ano passado). Uh.

A versão de Kygo para a faixa do U2 é uma EDM de paletó e gravata, sem os tradicionais e enfadonhos drops nem os irritantes sintetizadores à beira de um ataque de nervos, comuns ao gênero. Ao invés disso, Kygo optou por recriar o riff original com um nível de distorção aceitável, picotou os vocais aqui, espalhou uns pianinhos ali... nada original, mas, vá lá, eficiente para ouvidos com nível de atenção bem baixo e pés não muito exigentes do público a que foi destinada.

Original:



Como ficou:

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Sexta Feira Bagaceira: Secret Service


Tem tudo pra ganhar sua antipatia: uma canção que se chama "Oh Susie" e uma banda chamada Secret Service.


"Oh Susie" é o primeiro single do grupo sueco, lançado em 1979. Ficou 14 semanas em primeiro lugar na parada local, depois virou hit mundo afora. Aqui no Brasil saiu nessa versão sete polegadas acima. A faixa pega carona em alguns bondes da época: o emergente technopop, uma levadinha disco, soft rock, new wave. Gosto muito dos sintetizadores e o refrão dá pra decorar na primeira audição. Estranhamente constrangedora, datada. Na pista, a reação quase sempre é um misto de incredulidade e contentamento. O ex-vocalista da banda, Ola Håkansson, fundou a Stockholm Records em 1992, lançando nomes como The Cardigans. O que o redime, um pouco, dos pecados cometidos durante o período de atividades de sua banda.

"Oh Susie": "... we were much too young..."

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Disco Do Mês: Tender


Dois caras que se conhecem, descobrem afinidades musicais, gravam uma série de músicas, até que uma delas ganha execução considerável para atrair uma grande gravadora, que assina um contrato com a recém-criada banda e joga a dupla rumo ao estrelato. É parecida, mas essa não é exatamente a história do Tender e sim a do Lighthouse Family. E as semelhanças entre os dois não vão muito além do fato de ambos virem da Inglaterra e terem o R&B como leitmotiv. Só que enquanto as melodias ensolaradas do Lighthouse Family emolduram canções que versam sobre amor, esperança e boas vibrações, o terreno explorado pela dupla do Tender, James Cullen (vocais) e Dan Cobb (teclados), é o oposto muito mais sombrio; um mergulho nas águas turvas do desamor, desapontamento e perda.   

Com nove (de um total de doze) músicas inéditas, o debut do Tender, Modern Addiction (Partisan Records), traduz sentimentos tão comuns aos ouvintes que tornam as canções familiares instantaneamente, apesar (ou por causa) das letras aguçadas e diretas, de um romantismo em estado febril, mas não piegas. O instrumental de Cobb é simples mas incrivelmente eficiente, converte as letras num certo tipo de paisagismo sonoro, com uma paleta de sons distribuídos precisamente em cada faixa - ora lúgubre e ritualístico ("Hypnotised", "Vow", "Trouble"), ora desenvolvido em células suaves, quase dançantes ("Machine", "Powder"). A diversidade dos arranjos, predominantemente sintéticos e percussivos (nunca grandiloquentes), são o contraponto perfeito para os vocais murmurantes de Cullen desfilarem suas letras quase como confidências de seus amores perdidos em climas enfumaçados pelos teclados. A música do Tender atualiza o R&B britânico com o uso contido da tecnologia, há vários hits em potencial em Modern Addiction (o desempenho desse álbum pode - e deve - dar uma segunda chance para os singles "Erode" e "Machine" irem ao encontro do mainstream), para que, finalmente, as comparações com o Lighthouse Family encontrem mais uma similaridade: a dos números acima dos seis dígitos. Faz por merecer.

"Nadir": será o Tender 'The Next Big Thing'?

domingo, 10 de setembro de 2017

Ambiente-se


No final de Setembro do ano passado, a "bíblia indie" Pitchfork ranqueou os 50 melhores álbuns de ambient music já gravados. Esse aí da foto, Ambient 1: Music for Airports (1978), de Brian Eno, está no topo da lista.

Comprei esse disco totalmente às cegas, há uns 10 anos. Conhecia o Eno do Roxy Music, mais algumas produções e colaborações, mas de seus lançamentos solo, praticamente nada - situação não muito diferente da de hoje em dia, confesso. Ouvi pouco esse vinil durante esse tempo. São experimentos minimalistas; camadas sobre camadas de sintetizadores, vozes, pianos, manipulação de tapes... tudo para "produzir peças originais ostensivamente (mas não exclusivamente) para momentos e situações particulares com vistas a construir um pequeno, mas versátil, catálogo de música ambiental adaptado a uma ampla variedade de ambientes e atmosferas" (segundo o próprio Eno escreveu no encarte do LP, na foto acima).

Não é meu preferido do gênero (Chill Out, do KLF, está em primeiro na minha lista), mas esse Music for Airports passa longe de definições pejorativas como "música enquanto papel de parede". Este não é um álbum pra ser ouvido enquanto se lava a louça - embora o próprio Eno tenha considerado que a música aqui pode soar "tão ignorável quanto interessante".

Ambient 1: Music for Airports: se você dormir no meio da execução, tio Eno te perdoa.

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Sexta Feira Bagaceira: Noel


Pedra fundamental do freestyle: "Let the Music Play", faixa de 1983 da cantora Shannon. Um marco da dance music. Claro, inspirado pelos alemães duros de cintura do Kraftwerk ("Numbers"), Afrika Bambaataa já havia experimentado com esses beats de funk sintético em 1982 ("Planet Rock"), mas o single de Shannon injetou aquele tempero latino característico do gênero e um apelo pop que fez a canção chegar aos primeiros lugares das paradas americanas.
O nova-iorquino Noel Pagan seguiu direitinho a cartilha do freestyle no seu debut autointitulado - que tinha no time de produtores gente como Paul Robb (Information Society), John "Jellybean" Benitez e "Little" Louie Vega - e conseguiu emplacar alguns hits. "Silent Morning" é sua canção mais conhecida. Incluída na trilha da novela Vale Tudo, em 1988, estourou Noel por aqui e trouxe consigo uma avalanche de artistas de freestyle que ganharam projeção e popularidade em rádios e pistas brasileiras: TKA, Stevie B, The Cover Girls, Will to Power, Tony Garcia... a lista é grande.

Noel bem que tentou se desvencilhar do freestyle em sua tentativa pop rock Hearts on Fire, álbum de 1993, mas o resultado foi decepcionante e, mesmo sem gravar discos há um bom tempo, o cantor permanece na ativa fazendo shows.

"Silent Morning": expressão facial notável.

quinta-feira, 7 de setembro de 2017

A Esquisitice Compensa?


Art Rock é um guarda-chuva multifacetado, que tanto pode abrigar gente que faz o rótulo ser visto com bons olhos (leia-se ouvidos), como o Roxy Music, ou pode trazer para perto de si abacaxis do tamanho de um Kansas, por exemplo. Fato é que discos que já nascem com o carimbo de Grande Arte estampado em suas capas geram uma expectativa que pode transformar-se em decepção assim que a agulha pousa no vinil (ou quando você clica no play); por presunção, vaidade ou falta de talento, mesmo. O australiano Angus Andrew, que agora conduz sozinho o Liars, segue pelo tortuoso caminho escolhido para o seu pop oblíquo por natureza, que, no final das contas, junta art rock e eletrônica, com resultados ambíguos. Com um novo álbum recém lançado (TFCF, Mute Records) e uma temática centrada quase que exclusivamente sobre a degeneração da relação entre Andrew e seu ex-companheiro de banda, Aaron Hemphill, o Liars soa desafiador ao disparar uma metralhadora de batidas abrasivas ("Staring At Zero"), toneladas de amostras de sons/timbres esquisitos, violões que surgem redentores e vocais ora cantados com a doçura de um Wayne Coyne ("No Help Pamphlet"), ora declamados com o tédio abissal de um rap desengonçado em slow motion à Beck Hansen ("The Grand Delusional"). No final de Agosto, o Liars jogou no Youtube o primeiro vídeo extraído de uma canção de TFCF, "Cred Woes" e ela deixa muito claro que o trabalho da banda-de-um-homem-só vai trilhando propositalmente essa rota perigosa, que pode ser o equivalente sonoro de um quadro de Jackson Pollock ou, na pior das hipóteses, de Romero Britto. Para decodificar a arte de Angus Andrew, escolho os dois.

"Cred Woes": esquisitice que compensa?

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Sexta Feira Bagaceira: Captain Hollywood Project


O nome de guerra não era à toa: Tony Dawson Harrison, o Captain Hollywood, era realmente capitão do exército americano. Tio Sam perdeu um militar mas o mundo pop ganhou um, hããã... bom dançarino. Certamente Harrison não vai ser lembrado por sua voz rouca e sombria, rapeando no meio de divas flamejantes com pulmões e gargantas muito mais privilegiados.
Seu single de estreia, "More And More" (1992), é uma típica obra eurodance: techno diluído, pop enérgico, riffs ganchudos de sintetizador, refrãos repetidos à exaustão. Fez tanto sucesso que gerou uma "Parte 2", disfarçada sob o nome "Only With You" - que, descontando o rap sem graça de Hollywood - acho superior à "More And More". Simpatizo com ambas, no entanto.



O álbum, intitulado com a pérola de sabedoria Love Is Not Sex, vendeu bem, manteve o projeto em evidência durante 1993 e gerou mais dois singles (a boa "All I Want" e "Impossible"). Captain Hollywood mantém-se na ativa até hoje, provavelmente esperando um revival eurodance acontecer.