O Culture Beat é um projeto alemão de Eurodance (ainda na ativa), fundado em 1989 pelo produtor Torsten Fenslau (falecido num acidente em 1993). Pouco antes de sua morte, Fenslau ainda viu o grupo estourar a banca com o single "Mr. Vain", lançado no começo daquele ano e número um em 13 países. "Mr. Vain" conta com os ótimos vocais de Tania Evans, que substituiu a primeira vocalista do projeto, Lana Earl - que canta no terceiro single do Culture Beat, "I Like You", ainda de 1990. De sucesso moderado nas charts, mas bem executada nas pistas do mundo inteiro, "I Like You" é um clássico exemplo da house europeia que dominaria o mundo até a metade dos anos 90: rap nervoso (a cargo do americano Jay Supreme), típico refrão-gancho feminino e instrumental não muito original, mas eficiente. Aqui ainda há samples precisos, uma linha de baixo potente e pianos galopantes no melhor estilo ítalo. Memorável.
Voyager, quinto álbum do Vitalic (o produtor francês Pascal Arbez-Nicolas), saiu no começo do ano e parece já ter envelhecido uns dez anos. Na verdade, metade desse tempo se passou desde o último dele, o fraco Rave Age, mas a sensação de déjà-vu é constante durante os 42 minutos do novo disco.
Não que isso seja ruim, afinal não tem nada no techno atual que não soe
como reciclagem. O problema - mais uma vez num disco do Vitalic - é que Voyager
oscila demais. O techno espacial (evidenciado pela arte de capa,
título, temática das canções e timbres usados) perpetrado por Arbez tem
ótimos momentos de inspiração eletrônica e nostálgica, como em "Waiting
For The Stars", com arpejos pesados de baixo sintético (que impulsionam
uma grande canção pop dançante) ou "Levitation", que é mais Chemical
Brothers que o próprio
Chemical Brothers recente, embora a colisão de sintetizadores tenha me
lembrado de cara "It's More Fun To Compute", do Kraftwerk (1981). A tristonha "Hans Is Driving" (com um vocoder lânguido e vocais "reais" de Miss Kittin)
caberia em qualquer álbum do AIR e com um bom fone de ouvido é
possível ainda perceber sutilezas como um lindo coral celestial no segundo
plano. "Use It Or Lose It" também não faz feio, mais enérgica e dançável
que a média do disco. Ainda da metade apreciável de Voyager,
"Don't Leave Me Now" é um belo encerramento; uma delicada e emotiva
faixa (coproduzida por Roger Hodgson, ex-Supertramp), que parece ter sido gravada na solidão-conforto de uma estação
espacial. Os maus momentos passam por "Lightspeed" e seu riff de
sintetizador grosseiramente baseado em "Funkytown" do Lipps, Inc. (1979), pela viagem prog sem sal de "Nozomi", a pretensão barroca de "Eternity" e a trôpega "Sweet Cigarette".
No fim das contas, ignorando algumas faixas (ou tentando ter mais paciência do que eu tive), Voyager é uma boa audição. Seu lado mais experimental soa árido e pedante, não acho que seja a praia de Vitalic. Já quando ele usa o que parece ser uma bela coleção de sintetizadores vintage para compor canções de inegável apelo pop (como "Waiting
For The Stars" e "Don't Leave Me Now"), o resultado é altamente positivo. No mínimo, dá pra dizer que Voyager é bem melhor que seu antecessor e, ao menos, não caiu na vala comum EDM.
Sim? Frankie Knuckles, Marshall Jefferson, Larry Heard, Ten City: singles espetaculares, nenhum álbum inesquecível.
Não? Leftfield (Leftism), Daft Punk (Homework), Basement Jaxx (Remedy), Black Box (Dreamland)... há vários exemplos de gente que dedicou o mesmo cuidado ao álbum que dispensou aos 12 polegadas.
Empate técnico.
DJ e produtor de Chicago (espécie de Jardim do Éden da coisa toda), Lee
Foss já tem no portfólio uma bela coleção de singles autorais -
que ele lança desde 2010. E chega a 2017 disposto a aumentar a
porcentagem dos Discos de House Que Valem a Pena Ouvir.
Seu recém lançado álbum de estreia Alchemy (Emerald City Music, 2017) é, numa palavra, primoroso. Parta do princípio que um bom álbum - independente do gênero - é aquele que funciona, também, em casa. No caso de um disco de dance music, que a aplicação não se restrinja somente às pistas de dança. Ponto para Foss. Alchemy rola inteirinho sem ter nada que te faça procurar o botão skip. São 12 canções absolutamente bem feitas, house em essência, mas perfeitamente digeríveis para qualquer apreciador de boa música pop. Mesmo nas faixas que parecem exclusivamente direcionadas para execução entre luzes ofuscantes e volume médio de 110 decibéis (uma boate, por exemplo), há elementos na música que amenizam a experiência para o ouvinte médio. "Deep Congo", a faixa de abertura, é um caso assim. Com uma linha de baixo sintética de fazer tremer a cristaleira e vocais picotados no refrão, há várias camadas de teclados trabalhando no segundo plano que fazem com que as amostras mais ásperas de som acabem harmonizando perfeitamente em conjunto. O mesmo princípio aplica-se às instrumentais "Transit Of Venus" (absolutamente criativa em suas variações de baixo), "Laserdance" (com suas baterias eletrônicas paleolíticas) e ao encerramento "Lake Shore Drive" (camadas sobre camadas de teclados engrenados num estilo mais próximo à Detroit do que Chicago).
O mesmo apuro dedicado em cada hi-hat, em cada timbre de teclado de Alchemy, também é conferido aos vocais e na escolha de quem canta no álbum. De uma nova safra apadrinhada por Foss viceja a impressionante Alex Mills, que participa brilhantemente de "Haunted"; o sempre presente Ali Love (que já gravou várias faixas com Foss, incluindo o projeto Hot Natured, com o outro chefão do selo Hot Creations, Jamie Jones); a doce Camille Safiya (que participa em "The Gift" e na faixa título); Anjulie (na refrescante pop song "Green Light") e Josh Taylor na funky house "Play With Fire".
Alchemy (como tudo que Lee Foss já pôs as mãos) dispensa formalmente truques e clichês encontráveis facilmente na cena dance mainstream atual - ambiciosa, cheia de vaidade e arrogante como nunca. É um álbum sólido de House Music (merece as maiúsculas) que não despreza o pop, sem pasteurização. Positivamente detalhista, altamente dançável e de uma audição prazerosa do início ao fim.
Enquanto o sofrível Chainsmokers vai pra primeiro na Billboard, Lee Foss, em seu debut, provavelmente cravou o que deve ser o disco de house do ano. Não perca.
"Haunted": só uma das muitas faixas excelentes de Alchemy.
Sei não, mas fiquei com a impressão de que o austríaco Marcus Füreder quer ultrapassar as janelas das casas europeias. Mesmo não frequentando os primeiros lugares das paradas, o pioneirismo de seu projeto Parov Stelar no campo do electro swing / future jazz sempre foi muito bem assimilado pelo público do Velho Mundo, mas no resto do planeta, Füreder provavelmente pode ir à padaria sem ser incomodado. Até então com uma produção cuidadosa e sempre com ótimos vocalistas convidados, seu novo single "State Of The Union" é de um panfletarismo perigoso e musicalmente ordinário, com naipe de metais qualquer nota e estrutura dance bem pop - muito próximo às tentativas recentes de nulidades como (argh) Avicii. Luz amarela acesa.
Visitando o Wikipedia de Gretchen, me espantei com um dado: ela vendeu mais de 12 milhões de discos. É mais que o Kid Abelha e Lulu Santos, o dobro de Skank e Titãs. Há de considerar a relevância da informação para a, hummm, "cena pop" brasileira. Ainda mais para uma artista que nem vivia exclusivamente da música. Além de cantora, a carteira de trabalho de Maria Odete Brito de Miranda Marques pode tranquilamente estampar as profissões de atriz, dançarina, youtuber e personalidade da televisão - regulamentadas ou não (Rainha do Bumbum é título, não conta para aposentadoria).
Fato é que Gretchen iniciou, mesmo, como cantora, no grupo vocal feminino As Melindrosas, fazendo versões de cantigas de roda sob bases de disco music. A despeito da ideia insólita, os quatro primeiros álbuns do grupo venderam mais de quatro milhões de cópias, o que chamou a atenção do DJ e produtor argentino radicado no Brasil Mister Sam, que a lançou em carreira solo. O debut da cantora (então com tenros 19 aninhos) foi My Name Is Gretchen (capa acima), de 1978, pop com toques de disco e mambo. No geral é fraquinho, Gretchen mais sussurra do que canta (arrisca uns trinados na tentativa meio glam de "Rock'N Roller"), mas imagino que coisas como "I Love You, Je T'Àime" e "My Name Is Gretchen" devem ter deixado a turma de Ernesto Geisel meio sem saber o que fazer quando ouviu. Canções de gosto duvidoso à parte, "Freak Le Boom Boom" é o grande hit aqui. Levadas de violão e piano irresistíveis, palmas por cima da caixa da bateria, trompete chicano e Gretchen gemendo a letra com trechos em inglês, espanhol e francês. Resultado: o single vendeu mais de cem mil cópias, o álbum My Name Is Gretchen foi parar em 5 milhões e nascia um clássico das pistas (o single saiu em vários países da Europa, inclusive). Fora o que ela deixava a galera da mão direita suando frio cada vez que aparecia na Discoteca do Chacrinha.
É um projeto ambicioso: o DJ e produtor alemão Aksel Schaufler (a.k.a. Superpitcher) já tem prontinho seu terceiro álbum, The Golden Ravedays. Acontece que ele vai lança-lo em doses homeopáticas. São 12 discos com duas faixas cada e cada faixa na casa dos dez minutos, disponíveis em vinil e digital, que serão jogados no mercado - um por mês - durante este ano.
Ouvi o primeiro, The Golden Ravedays 1 (os discos saem pela Hippie Dance, selo que Schaufler mantém com o produtor mexicano Rebolledo, ligado à Kompakt) e não achei lá grande coisa. O lado A com "Little Raver" é um negócio meio psicodélico-esquisitinho, dançabilidade zero, vocais chapados e riff de teclado sessentista repetindo-se ad infinitum. Já no B temos "Snow Blind", com seus hipnóticos e quilométricos 14 (!) minutos, onde Superpitcher retoma o 4X4 e sampleia a introdução de uma das pepitas do repertório de Sade, "Immigrant". O sample, aliás, eu caguetei pro Who Sampled e eles aceitaram minha denúncia. A propósito, esse exercício de dedo-durismo acabou sendo também minha primeira contribuição para o site.
O reggae, em suas mais variadas formas (dub, dancehall, ragga), sempre esteve presente na maioria dos álbuns do Thievery Corporation. Desde o debut Sounds From The Thievery Hi-Fi (1996), fortemente influenciado pelo dub, passando por referências mais (The Richest Man in Babylon, 2002) ou menos (Saudade, 2014) explícitas, o duo de Washington, D.C. formado por Rob Garza e Eric Hilton explora com maestria e propriedade o legado musical da ilha caribenha.
Então, o que a competente dupla oferece no seu mais recente lançamento The Temple of I & I(saiu em Fevereiro, pelo selo Eighteenth Street Lounge Music, de propriedade do Thievery) não causa nenhuma surpresa a quem já acompanha o grupo há algum tempo. A diferença é que desta vez temos um disco quase que inteiramente dedicado ao reggae. As duas únicas exceções entre as quinze faixas são "Love Has No Heart" (com um belíssimo arranjo de cordas) e um certo ar nostálgico encharcado de ecos e dos vocais melancólicos de Elin Melgarejo na trip enfumaçada de "Lose to Find". O restante do álbum traz desde a pegada mais roots ("Strike the Root", "Weapons of Distraction", "Drop Your Guns ", "Babylon Falling", com ótimos naipes de metais), passando por reggaes digitais ("Time + Space", "Thief Rockers"), fusões com rap ("Letter to The Editor", "Ghetto Matrix", "Fight to Survive") e faixas que parecem já ter nascidas como clássicos do gênero ("True Sons of Zion", "Road Block"), tudo feito com o esmero característico das produções de Garza e Hilton. The Temple of I & I conta com oito vocalistas convidados, que fornecem uma diversidade estilística às canções equalizada finamente pelo Thievery, garantindo ao trabalho a homogeneidade necessária para que nada soe fora do lugar, mesmo que o downtempo classudo e refinado da dupla reúna tantos elementos diferentes. Fora que é bem provável que eu deva estar completamente por fora do que anda acontecendo ao reggae ultimamente, porque este é, sem dúvida, o melhor disco do gênero que ouço em (muitos) anos.
Francamente, achei fraquíssima essa "Fire", nova da Beth Ditto (Gossip). Vi muita gente carimbando a tag "Dance" no single, mas... onde? "Fire" é uma faixa que o Alabama Shakes faria, usando claps na caixa. De qualquer maneira, tô curioso pra ver se o primeiro álbum solo de Ditto, Fake Sugar (que só sai em Junho) vai soar assim, também. Eu espero que não. Prefiro que tenha mais a ver com a excelente "I Wrote That Book" (2011), ali sim uma experiência muito bem sucedida com house da cantora do Arkansas.
No comecinho dos anos 90, o argentino Marcelo Donolo (então tecladista do duo technopop Tek Noir) e o vocalista brasileiro Filippo Crosso - vislumbrando uma hipotética carreira internacional - escolheram os nomes artísticos Mark Rhiley e Phillip Ashley, apostando num possível sucesso além fronteiras de sua recém formada banda, o Tek Noir. Ambições à parte, não foi bem isso que aconteceu. A curta carreira do Tek Noir durou dois discos, Alternative de 1990 e Destination de 1993, e depois disso, nunca mais ouvi falar da dupla Rhiley/Ashley. Felizmente, encontrei Donolo (que está morando nos Estados Unidos) uns meses atrás da única maneira possível disso acontecer: pelo Facebook. Eu estava lendo um post do Front 242 (não por acaso, uma das paixões de Marcelo) e lá estava ele, comentando a respeito. Achei muita coincidência uma pessoa fã do grupo belga com o mesmo nome do cara responsável pelos sintetizadores e programações da nossa (sem medo de errar) melhor banda synthpop. Verifiquei o perfil. O próprio. Pedido de amizade aceito, pedido de entrevista aceito e aí está, com muito orgulho, Marcelo Donolo, do Tek Noir.
1) Como você e o Filippo se conheceram?
Uma amiga minha nos apresentou. O Filippo tocava numa banda cover e
fui assistir o ensaio na casa dele depois de ter visto a banda numa
festa, o meu "Prom". Eu tinha uma demo muito ruim que tinha feito num sintetizador Ensoniq ESQ1, mas logo compartilhamos ideias sobre o tipo
de música que ouvíamos e o tipo que queríamos compor. Uma semana depois,
formamos a banda. No próximo fim de semana, fomos assistir O Exterminador do Futuro no cinema - lembra da cena em que o Terminator mata quase
todos numa discoteca? A discoteca chamava-se Tech Noir.
2) De onde partiu seu interesse por música e como surgiu a ideia de montar o Tek Noir?
Minha mãe tocava piano e tínhamos um em casa. Cresci ouvindo e
tocando música clássica. No começo dos anos 80, ouvi três artistas que
me influenciaram muito: O Duran Duran, o Kraftwerk e Jean-Michel Jarre.
Logo descobri Human League, Depeche Mode, Pet
Shop Boys, Front 242 e Nine Inch Nails. As ideias musicais que formaram o som do
Tek Noir vieram, em grande parte, dessas influências.
3) Como foi a produção de Alternative, o primeiro álbum, dividida entre Dino Vicente e Mark Brydon?
Queríamos explorar dois lados da música eletrônica: o lado pop
(Tek) e o lado mais experimental, ou "dark" (Noir). O Brydon tomou
conta do lado A ("Beat the Rhythm", "Drawings of Sorrow", etc...) e o Dino do
lado B ("In the Name of the Father", "Final Fall"). Os
dois foram espetaculares e tinham estilos muito diferentes. O Mark
preferiu reconstruir o som do Tek de acordo com o seu entendimento do
que era o mercado Europeu naquele tempo. O Dino optou por usar o próprio
ponto de vista da banda para melhorar a qualidade
sonora e a composição, sem influenciar o caráter do nosso trabalho. O
resultado foi interessante... o lado A parece muito o estilo do Mark. O
lado B, do Tek. Ao fim do dia, acho que o Dino foi muito mais fiel em
preservar o som da banda. Tenho tremendo respeito
pelo Dino.
4) Para os shows da época, quais equipamentos vocês dispunham?
Dois ESQ1 da Ensoniq, um DAT da Sony, a bateria TR-505 da Roland e um
computador com Cakewalk. Os dois discos do Tek Noir foram feitos no ESQ1.
Adorava esse sintetizador.
5) O debut Alternative tem um status cult hoje, você tem ideia de
quantas cópias o álbum vendeu e o que poderia ter sido feito para que
ele tivesse realmente estourado, considerando seu potencial?
Muito legal ter esse status cult! Acho que vendeu umas 75,000
cópias. O problema da Stiletto foi que não tinham paciência nem
experiência ou tampouco sabiam como promover uma banda e os canais de
distribuição eram poucos e novos na época. Faltou infraestrutura.
A maioria das cidades onde o Tek tocou não tinham discos nas lojas.
Nossos "managers" não tinham nenhuma estratégia. Os shows eram uma
maneira deles ganharem dinheiro. Não tinham nenhum interesse no futuro
da banda. Realmente uma pena.
Alternative, inteiro no Youtube:
6) O que você, avaliando hoje, faria diferente sobre Alternative?
O Dino devia de ter produzido o disco inteiro. "Beat the Rhythm",
"Talk of Desire", e a "Drawings of Sorrow" eram muito mais interessantes antes da
produção do Mark. Eu teria incluído mais uma faixa, a "Is This Devotion",
que tínhamos em demo. Adorava aquela música, para
sempre perdida... não sei onde foi parar o K7.
"Falling In My Arms", do segundo (e último) álbum, Destination (1993):
7) O segundo e último álbum, Destination, tinha planos de ser
lançado pela Stiletto (que já havia encerrado atividades quando o disco
foi lançado, em 1993)? Como foi o processo de
produção/lançamento/distribuição desse álbum pelo selo Dance Xplosion
e porque o Tek Noir acabou logo em seguida?
Eu já estava cansado das dificuldades de trabalhar com a gravadora e
comecei a trabalhar numa empresa. Casei pouco depois de terminar o
Destination e decidimos terminar o Tek. O Filippo conseguiu produzir o
Destination pela Dance Xplosion, mas eu já estava
nos EUA quando começaram uma pequena tour com outro tecladista amigo
nosso.
"The Whole Of The World":
8) Tu tens ideia de como repercutiu o trabalho do Tek Noir fora do
país? Teve notícia de algum hit em alguma rádio ou parada estrangeira?
Quais países vocês se apresentaram na época?
Tocamos numa rádio em New York e a banda tocou no rádio na Argentina e no Peru. Não fizemos nenhum show fora do país.
9) Existe alguma possibilidade do Tek Noir voltar, para algo como
uma série de shows comemorativos, reedição de seus dois álbuns, alguma
coisa do tipo?
Eu faria um terceiro disco e uma mini tour, com certeza. Numa época,
tentei convencer o Filippo de compor algo juntos, mas não deu certo. Fiz
vários projetos solo depois de um tempo... o Khommand 45 e o ALTERSTÆT, que está no iTunes, Amazon, etc... Hoje
em dia seria super fácil produzir um disco e distribuí-lo. Que tal a
gente convence-lo?
"Serenity", do projeto solo de Marcelo, ALTERSTÆT:
10) O que tu tens ouvido e o que não sai do seu fone de ouvido nunca? Quais são suas músicas preferidas, eternas e atuais?
Legal essa pergunta!
Eternas:
1. "Enjoy the Silence" e "World in My Eyes" - Depeche Mode
2. "Don't Crash" e "Headhunter" - Front 242
3. "Blue Monday" e "1963" - New Order
4. "It's a Sin"e "West End Girls" - Pet Shop Boys
5. "Seventh Stranger" e "Save a Prayer" - Duran Duran
6. "The Man Machine" e "Radioactivity" - Kraftwerk
7. "Oxygen" e "Zoolook" - Jean-Michel Jarre
8. "Coolesville" - Laurie Anderson
9. "Falling in My Arms"e "Twixt Land and Sea" - Tek Noir ;)
10. "Frozen" e "Bedtime Story" - Madonna
11. "Lack of Sense" - Tribantura
Atualmente:
1. "The Dictator Decides" - Pet Shop Boys
2. "Serenity" - ALTERSTÆT :)
3. "Where's The Revolution?" - Depeche Mode
4. "Oxygen 3"- Jean-Michel Jarre
5. "Kill Your Darlings" - Mesh
6. "Judge of My Domain" - Covenant
7. "Amor Fati" - Washed Out
8. "All is Full of Love" - Björk
Eu não conhecia Johnny Hansen pessoalmente. Éramos amigos no Facebook (e taí uma das coisas boas da rede: te aproximar de pessoas que tu admira), então vez ou outra trocávamos algumas palavras através de algum post - o que foi suficiente pra eu sacar as altas doses de ironia, acidez e, principalmente, inteligência e generosidade dele. Vinha pensando há alguns dias em entrevistá-lo aqui pro blog, por ocasião do lançamento do novo álbum do Harry, The Dark Passenger, programado para este ano. Não deu tempo. Ontem, Hansen faleceu. Seu legado e contribuição para o rock e a eletrônica feitos aqui no Brasil - especialmente à frente do inovador e impressionante Harry - ficam como prova da inquietação, pioneirismo e talento de um artista que, infelizmente, o Brasil não soube ouvir. Valeu, Johnny.
O prolífico Dominick Martin (a.k.a. Calibre) começou a produzir em
1995 e grava desde 2001. De lá pra cá, Martin mantém a média de quase um
álbum por ano e os singles e EPs eu já desisti de tentar contar.
Diluição do seu drum'n'bass sombrio com tantos lançamentos? Nem perto
disso. Cada disco novo desse produtor irlandês vem recheado de ótimo
material, a despeito dele não economizar no número de faixas: em The Deep, recém lançado, são doze músicas e mais de uma hora de (boa) música.
O liquid funk (meu subgênero preferido do drum'n'bass) de Calibre é
primoroso: na abertura "No One Gets You" e em "Complain" ele encharca os
vocais de éter e joga os subgraves para o térreo, em "Enter" teclados
ameaçadores medem forças com as baixas frequências e em "Up
In Smoke", um naipe de metais jazzísticos casa formidavelmente com o
beat acelerado. Pausas estratégicas para o ouvinte tomar fôlego e Martin
tira o pé do acelerador nas atmosféricas "Footloose", "Blind For Bang" e
"Round Box" ou mesmo na placidez da arritmia semi abstrata de "Better Than Me". A quase deep house "Lit" não soa deslocada num álbum com boas doses de soul e jazz injetadas nas canções e em "Give It Up",
Calibre parece suprimir propositalmente justo a caixa da bateria para
fazer com que a faixa soe como uma das mais hipnóticas de The Deep.
Seja para os apreciadores de eletrônica sem distinção de gêneros ("Mr Natural"), seja
para os clubbers ávidos por movimentos de Tai Chi Chuan em fast forward ("Echoes"),
The Deep cumpre com louvor as expectativas. Se depender de gente do primeiro escalão como Calibre, o drum'n'bass vai bem, obrigado.
Formado pelos produtores Lenon Scarpa e Américo Simões, o SoFly lançou dois singles bem distintos este ano: "Somebody Like You" e "Stay With Me". "Somebody" tem uma guitarrinha sinuosa duelando com o baixo pesado e um bom refrão pop, com cheiro de praia e Warung lotada. Já "Stay" adultera os vocais com um filtro irritante e tem um drop horroroso aos três minutos e meio - a despeito do resto do instrumental ter lá suas boas ideias (eu sempre caio no truque dos violões e palmas na caixa). Agora, se você abomina EDM (mesmo que o duo jure que o que faz tem "elementos do Deep House"), fuja.
Os dois singles que o Jamiroquai lançou em Janeiro e Fevereiro ("Automaton" e "Cloud 9", respectivamente) deram uma pista animadora de como poderia soar Automaton, o oitavo álbum da banda (o mais recente, Rock Dust Light Star, é de 2010). Produzido por Jay Kay e pelo tecladista do grupo, Matt Johnson, o disco impressiona tanto quanto a faixa-título. Tudo funciona com a mesma precisão e eficiência do Aston Martin de Jay: amostras magníficas de sintetizadores vintage, vocoders, baixos galopantes, timbres orgânicos de bateria e os vocais afinadíssimos e particulares de Kay - límpidos e potentes nas notas mais altas, sussurrados e macios nas mais baixas. Além de "Automaton" (um funk cibernético com refrão de levada disco) e "Cloud 9" (mais relaxada mas ainda totalmente dançável em sua versão original, a faixa ganhou um propulsor de Fred Falke na versão remix), saltam aos ouvidos as linhas de baixo espetaculares de "Superfresh" e "Nights Out in the Jungle", os violinos estrategicamente colocados em "Shake it On", "Summer Girl" e "Hot Property" e o boogie eletrônico "Carla". "Vitamin" lembra as origens acid jazz do Jamiroquai (especialmente expressas no debut Emergency on Planet Earth, de 1993) e surpreendente, mesmo, é "We Can do It" e seu tempero de sabor latino absolutamente delicioso. Automaton é excepcionalmente bem produzido, tem uma qualidade de som irretocável em todos os detalhes (dos vocais ao wah-wah da guitarra), é totalmente viável comercialmente sem ser pasteurizado e não vejo arestas a aparar em suas 12 faixas. Prova por A mais B que fazer um disco que funcione na pista, no rádio ou na sala de estar ainda é perfeitamente possível sem apelar para truques e clichês em voga no meio de uma cena pop caótica como a atual.