A cantora escocesa Nicolette (Nicolette Love Suwoton), ganhou notoriedade por suas colaborações com o Massive Attack (em "Three" e na fantástica "Sly", ambas do segundo álbum dos triphoppers de Bristol, Protection, de 1994), mas também no techno de gosto duvidoso do LA Style ("I'm Raving"). Com mais algumas aparições esporádicas e um EP gravado em 2012 (Modern Stories), Nicolette volta com sua voz macia e aconchegante (que já foi descrita como "Billie Holiday on acid"), em um single lançado no final de Setembro ("Simple Life", Early Records) e um álbum (The Infinitive), que vem na sequência.
Afro-jazzística (Nicolette tem ascendência nigeriana), "Simple Life" parece percussivamente confusa à primeira audição, mas seus vocais continuam intactos e de uma beleza acachapante. Vale conhecer.
Estranhei o fato do projeto chamar-se Nile Rodgers & Chic. Nile e sua indefectível guitarra escovinha estão lá, mas o abençoado trio está desfalcado dos dois propulsores que moveram a banda rumo ao estrelato na segunda metade dos 70: um dos melhores baixistas da história (Bernard Edwards, falecido em 1996) e o metrônomo humano Tony Thompson (baterista, falecido em 2003). Então quem seria o Chic, em questão? Nomes mais e menos conhecidos aparecem nos créditos (Mura Masa, Vic Mensa, Craig David, Hailee Steinfeld, Emeli Sandé), mas nem mesmo Elton John e Lady Gaga chegam perto dos respeitáveis foles vocais e harmonias das três melhores cantoras que passaram pelo grupo (Norma Jean Wright, Luci Martin e Alfa Anderson). Adequado mesmo seria batizar de "Nile Rodgers & Friends".
Tem umas coisas bem simpáticas, como a jam smoothjazzística de "State Of Mine (It’s About Time)" - uma faixa que exemplifica o quanto o disco é obviamente bem tocado e produzido. Mas o que pega em It's About Time é o nível das composições, muito, mas muito abaixo do que foi o Chic do início de carreira. Sei que é uma comparação injusta, mas a verdade é que as canções não ultrapassam a temperatura do corpo, em nenhuma das 10 faixas. Vocoders à exaustão, o R'n'B sonolento de "Queen" (com a dupla Elton John e Emeli Sandé) e (o crime-mor aqui), o autocover totalmente dispensável do clássico absoluto "I Want Your Love", com vocais de Lady Gaga, ajudam a puxar a média pra baixo no saldo final.
Na maior parte do tempo, It's About Time lembra o Chromeo num dia ruim. E olha que eu acho o Chromeo bem fraquinho.
"Boogie All Night": um dos poucos momentos iluminados de It's About Time:
Vai tomando forma No Tourists, o sétimo álbum do ex-quarteto, atual trio britânico The Prodigy (o "dançarino" Leeroy Thornhill - que tinha uma função meio Bez na banda - caiu fora no longínquo 2000). Com lançamento programado para 2 de Novembro, o álbum já revelou dois singles: "Need Some1" (em Julho) e "Light Up The Sky" (no finalzinho de Setembro).
Encurralados musicalmente pelo próprio subgênero de eletrônica que os levou ao estrelato (o breakbeat), ambas as faixas pegam pesado na pancadaria e distorção e, no caso de "Light Up The Sky", as autorreferências estão bem nítidas (citações das já clássicas "Breathe" e "Smack My Bitch Up" são facilmente perceptíveis).
A despeito do Prodigy 2018 não trazer nada de novo, a banda garante que, ao menos, o som seja reconhecível à quilômetros de distância.
Três anos depois de um álbum mediano (Born in the Echoes, 2015) e de um single muito abaixo da média da própria produção da dupla ("C-h-e-m-i-c-a-l", 2016), Tom Rowlands e Ed Simons - os Chemical Brothers - voltam com a animadora "Free Yourself", lançada no finalzinho de Setembro. Com arpejos psicodélicos, um bassline retrô que vai fazer os alto-falantes trabalharem com vontade e uma letra despejada como palavras de ordem ("Free yourself, free yourself / Free yourself, free me, dance / Free yourself, help to free me, free us / Free yourself, dance"), a música deve ganhar fácil as pistas de dança, mas estou curioso pra ver a performance nos paradões. Primeiro pra sentir se a popularidade do duo chega perto do que era na segunda metade dos 90 e também porque o último single que beliscou o Top 10 na Inglaterra foi "Galvanize" (do álbum Push the Button), número 3 na UK Singles Chart em Novembro de 2004.
Quem diria que da pequena Moldávia
viria a canção pop que me arrebatou mais rapidamente neste 2018? O
autor do feito é o produtor e compositor Ion Chirinciuc, que assina como
Vanotek desde 2015, ano de seu debut, o single "My Heart Is Gone".
Extremamente pop, Ion foi lapidando seu som single após single até
chegar no bombom dançante de "Back To Me", lançado em Fevereiro deste
ano. Com os vocais cristalinos e emotivos da romena Eneli
(Ileana-Maria Popescu, cantora e compositora, de 21 anos), a faixa tem
uma sessão de cordas discreta e eficiente, cama perfeita para o refrão
certeiro. O sax incisivo é o gancho-cereja, que costura as estrofes e
gruda na memória tanto quanto o de "All That She Wants" grudou aos milhares em 1992. Vanotek grava pelo selo romeno Global Records, e, além dos singles, já tem um álbum lançado (No Sleep, do ano passado).
A ideia do grupo de produtores ingleses que se autointitulou The
Mastermixers não era nova. Mixar hits numa mesma batida em medleys
caça-níqueis foi a sacada do Ritchie Family em 1976 e mais especificamente dos holandeses do Stars On 45,
no começo dos 80. A diferença é que os 45 usavam cantores pra recriar
em estúdio canções do principal alvo do projeto: os Beatles. Já o Jive
Bunny sampleava na cara dura, mesmo. De Glenn Miller à Bill Haley, do
tema de Hawaii 5-O aos Everly Brothers. Como eles fizeram pra
licenciar os samples? Ótima pergunta. Mas os autores estão nos créditos
da contra-capa do disco e é um bocado de gente (e sei que em alguns
lugares, os samples não foram autorizados). O álbum foi, obviamente,
execrado pelos puristas (esses chatos) e pela crítica. A saudosa revista
Bizz chegou a chamar de "a mais repugnante armação dançável dos últimos
tempos". Exagero. Claro que o objetivo era entupir os cofres do pequeno
selo Telstar Records - e eles conseguiram: foram três singles em
primeiro lugar e o álbum em segundo, na Inglaterra - mas o lance é que
era divertidíssimo. Quem imaginaria na virada dos 80 pros 90, com todo
aquele papo de verão do amor, nova década e boas vibrações, esse proto-Gorillaz conceitual virar febre de pista com pot-pourris de sucessos de
décadas passadas?
"Swing the Mood", o single de estreia de 1989, já foi um estouro de
cara: oito samples engavetados num beat contínuo ("In the Mood", de
Glenn Miller e "Rock Around the Clock", de Bill Haley, entre eles)
fazendo o coelho doidão pular pro primeiro lugar nas charts de onze
países e contabilizar vendas com número de cópias acima dos seis
dígitos.
Minha preferida é "Rock and Roll Party Mix", uma alucinante colagem de
Little Richard, Chuck Berry, Chubby Checker e Ernie Maresca ("Shout! Shout! [Knock Yourself Out])". É um coringa ordinário: não tem festa retrô que eu não toque isso aí. E sempre funciona.
Techno subterrâneo, house lúgubre, sintetizadores ameaçadores, samples esquisitos, vozes etéreas... tudo isso mixado por este que vos tecla num set de uma hora em que o darkismo cruza com a dance music e gera um filhote que transita com desenvoltura tanto pela pista de dança quanto pela sala de estar. Clicaê!
Tracklist:
1) Aftermath (Robags Berchem Duff NB) by Hundreds (Krakatau Records) 2) Volta Cobby by Robag Wruhme (Pampa Records) 3) It's Only (DJ Koze Mix) by Herbert (Pampa Records) 4) XTC by DJ Koze (Pampa Records) 5) First Fires (Maya Jane Coles Remix) by Bonobo feat. Grey Reverend (Ninja Tune) 6) Bad Kingdom (DJ Koze Remix) by Moderat (Monkeytown Records) 7) Moth by Burial & Four Tet (Text Records) 8) Open Eye Signal by Jon Hopkins (Domino) 9) Your Darkness by Benoit & Sergio (Visionquest) 10) Believe by Traumprinz (Giegling) 11) When Radio Was Boss by Soulphiction (Pampa Records)
Deixando de lado a aposentadoria do Orbital divulgada em 2014, os irmãos Phil e Paul Hartnoll tomaram fôlego para anunciar um novo álbum programado para Setembro (Monsters Exist, o primeiro de inéditas desde a trilha para o filme Pusher, de 2012), lançar há poucos dias o single “Tiny Foldable Cities” e ainda começar uma turnê agora em Maio, com datas para Inglaterra, Irlanda, Rússia, Espanha e Holanda. Nada mau pra quem aparentemente estava de saco cheio de carregar seus teclados obsoletos pra cima e pra baixo. “Tiny Foldable Cities” encaixa-se no perigoso guarda-chuva IDM - eletrônica até a medula - mas dispensa formalmente a pista de dança. A faixa tem um arranjo intrincado de sintetizadores e ao mesmo tempo uma melodia quase assobiável, que se afasta de experimentações estéreis facilmente encontráveis no gênero. Muito apreciável.
Alex Paterson e seu fiel escudeiro, o suíço Thomas Fehlmann, preparam-se para jogar mais um álbum no mercado (o décimo quinto): No Sounds Are Out of Bounds está programado pro dia 22 de Junho, disco que marca a volta da parceria com a gravadora independente inglesa Cooking Vinyl (sai a alemã Kompakt, que lançou Moonbuilding 2703 AD, de 2015 e COW / Chill Out, World!, de 2016). Nomes de peso participaram das gravações, como o frequente colaborador (e exímio baixista) Youth (Killing Joke) e Roger Eno (irmão de Brian Eno). Saíram duas faixas como aperitivo, "Doughnuts Forever", mês passado e "Rush Hill Road", agora em Maio.
"Doughnuts Forever" é uma música que tem mais a ver - embora o instrumental soe mais "orgânico" - com o inacreditável álbum de estreia The Orb's Adventures Beyond the Ultraworld, de 1991, com samples de orquestra, uma belíssima levada de baixo, corinho angelical e trechos de vozes extraídas sabe-se lá de onde.
Já na houseada "Rush Hill Road", a linha de baixo passa por cima de tudo como um trator, mas deixa espaço pros excelentes vocais de Hollie Cook (cantora e tecladista, filha do ex-baterista do Sex Pistols, Paul Cook) e misteriosos sons orientalizantes. Totalmente acessível mas não pasteurizada, "Rush Hill Road" está na mesma vibe de pista de "Toxygene" (1997, 4º lugar no paradão inglês de singles).
Fiquei deveras decepcionado com o novo single do Disclosure. Conforme a própria dupla inglesa relatou, há alguns meses eles descobriram a cantora e atriz da Costa do Marfim Fatoumata Diawara e, fuçando em sua discografia, encontraram um trecho que chamou atenção e tiveram a ideia para "Ultimatum", a faixa em questão. Bom, é assim que a canção soa: um sample vocal encaixado numa house que - usando o próprio Disclosure como parâmetro - soa um tanto preguiçosa, com um riff circular de piano elétrico e umas TB303 espalhadas. Seria um bom lado B pra qualquer um dos singles de Settle, o fantástico debut do duo, de 2013. Mas pra um single padrão Disclosure, achei mais parado que saci de patinete.
As cenas são, vá lá, clássicas: Jennifer Beals voando de um lado pro outro em piruetas improváveis, Jennifer Beals suarenta acelerando estática no chão da sala, Jennifer Beals dançando pra geral num inferninho. Ficou pra sempre na minha retina e é a única coisa que lembro com clareza do blockbuster Flashdance (1983), um filme que deve ter passado dezoito vezes na Sessão da Tarde. O som que movimenta a ofegante atriz durante a performance é "Maniac", single de estreia de Michael Sembello, um ex-músico de estúdio que emprestou seus dotes com as seis cordas pra gente como Michael Jackson, Diana Ross, Chaka Khan, George Benson e Donna Summer, até apostar na carreira solo e emplacar um número 1 no Hot 100 da Billboard, logo de cara. Estrutura de synthpop com pegada de Hi-NRG, "Maniac" é uma boa canção pop que acabou alavancada por um filme despretensioso mas que comercialmente, deu muito certo e levou Sembello pra galeria dos one hit wonders oitentistas.
Também vale o confere na atualizada que os italianos do Bloody Beetroots deram na faixa, em 2007:
O nome Aldo, The Band já tinha aparecido em algum momento na tela do meu note, mas se eu ouvi o grupo paulistano de 2013 (quando lançaram o primeiro disco, Is Love) pra cá, devo ter escolhido a(s) faixa(s) errada(s), porque passou batido. Pensei que deveria ter, entretanto, um bom motivo pro Radiohead em pessoa (haha) escolher o Aldo pra abrir seus shows recentemente aqui no Brasil (junto com Junun e Flying Lotus) e isso acabou reativando meu interesse/curiosidade. Pesquisa aqui, baixa ali e o saldo é positivo. As faixas detestáveis ("Hold Me Back, Insane") estão em número menor, comparando com as adoráveis, como "Unbreakable", "Liquid Metal" e essa "Trembling Eyelids" - single lançado dia 20 de Abril que fará parte do terceiro álbum do grupo. Com slapadas de baixo, synths trôpegos, vocais sonolentos (no bom sentido) e batida hipnótica, "Trembling Eyelids" é uma ótima canção. E o Aldo, pode ficar tranquilamente na mesma prateleira de CDs (ou na mesma pasta de arquivos) de Holy Ghost!, The Rapture e Jagwar Ma, sem nenhum complexo de inferioridade. Muito pelo contrário.
Depois do álbum de estreia autointitulado de 2016 (que trouxe boas canções como "Charlemagne") ter chegado ao número um no paradão inglês (o que não quer dizer muita coisa, porque o disco teve uma das vendagens mais baixas da história para um primeiro lugar por lá), o Blossoms acaba de lançar Cool Like You, o segundo disco. Indie rock carregado de sintetizadores oitentistas e refrãos que parecem ter sido esculpidos na medida para grandes arenas, Cool Like You não arreda pé um milímetro da proposta inicial do grupo formado há pouco mais de cinco anos em Stockport, na Grande Manchester. Com um bom vocalista (Tom Ogden) na linha de frente, de novo com músicas bem feitinhas (nada no disco chega perto da maravilha "I Can't Stand It") e a despeito da total falta de ousadia e originalidade, o Blossoms lembra o Killers no ápice (que durou exatamente um álbum, Hot Fuss, de 2004) nos melhores momentos. Nos piores, lembra todo o resto da discografia do Killers.
"I Can't Stand It": os melhores três minutos da semana.
Mais surpreendente do que saber que Shaggy e Sting gravaram um álbum juntos é ouvir o primeiro single, "Don't Make Me Wait" e acreditar que a supostamente inusitada parceria já valeu a pena, só por esse lindo pedaço de reggae pop, cujo vídeo saiu em Fevereiro. O reggae - junto com o punk e o jazz - foi uma das bases para o rock econômico e preciso do Police de Sting e o jamaicano Shaggy formou-se nos sound systems e estourou seu dancehall no mundo inteiro em 2000, com o multiplatinado álbum Hot Shot. O disco da dupla, 44/876 (título relativo aos códigos telefônicos do Reino Unido e da Jamaica) acabou de sair (a referência não poderia ser mais esperta: foi lançado dia 20/04, ou, na gringa, 04:20) e agora é descobrir se tem mais alguma coisa tão boa quanto "Don't Make Me Wait".
O Underworld tocou em Reykjavik, capital da Islândia, dia 17 de março pela primeira vez desde 1994. Inspirada pela apresentação, a dupla britânica lançou uma nova faixa, "Brilliant Yes That Would Be" e o diretor (e frequente colaborador do duo) Simon Taylor criou um vídeo em que casa direitinho a aridez das belas e frias paisagens islandesas com o tema. "Brilliant Yes That Would Be" usa teclados plácidos e sombrios como pano de fundo para um improviso doloroso, congelado por um sintetizador lancinante. De arrepiar, em todos os sentidos.
"Brilliant Yes That Would Be: Underworld volta abaixo de zero.
Silent Poets e Nightmares On Wax: dois nomes da eletrônica trilhando o arriscado caminho do downtempo. É preciso mais do que experiência, bom gosto e sensibilidade pra não resvalar na pieguice com discos do gênero?
O Silent Poets, que já foi um duo, mas hoje é um projeto solo do DJ e produtor japonês Michiharu Shimoda, assusta no começo ao equilibrar-se perigosamente sobre a linha que separa o sentimentalismo extremo da ousadia em seu novo álbum Dawn (o primeiro em doze anos, saiu em Fevereiro pelo selo de Shimoda, Another Trip). As duas primeiras faixas, "Asylums For The Feeling" e "Distant Memory", com arranjos de cordas adocicados e envolventes, deixam dúvidas a respeito da capacidade de Shimoda montar canções que vão além do lounge na linha Café Del Mar. As incertezas vão se dissipando a medida que o disco avança - especialmente por causa dos reggaes de torque alto e lento que vem a seguir. A exuberante "Shine", com seus metais e ecos em profusão, o ragga "Non Stoppa" e o sensacional dub em slow motion "Division of the World", provam que Tóquio e Kingston podem estar mais próximas do que você imagina. Some a isso raps em japonês ("Tokyo", "Eternal Life"), beats espertamente engendrados (a instrumental "Rain" é um dos melhores exemplos), vozes escolhidas a dedo (a urgência da rapper israelense Miss Red e o timbre lindo da ótima Hollie Cook, filha do ex-baterista do Sex Pistols, Paul Cook, entre elas) e Dawn já é uma volta do Silent Poets a ser celebrada da melhor maneira possível: ouvindo o disco várias vezes.
"Division of the World":
O DJ e produtor britânico George Evelyn, a.k.a. Nightmares On Wax, já tem 30 anos de carreira e, além de ajudar a cimentar o trip-hop no começo dos anos 90, vem lançando álbuns sólidos e bem pensados ao longo desse tempo. Seu recente Shape The Future (lançado em Janeiro pela Warp Records) é diversificado sem perder a homogeneidade. O disco vem sob a forma de conexões enfumaçadas com a Jamaica (como em "Tomorrow" e "Citizen Kane", com dinâmica de reggae e técnicas herdadas diretamente do dub), enxertos de jazz ("Typical", "The Other Ship"), soul ("Deep Shadows"), blues ("On It Maestro") e farta distribuição de timbres amadeirados de teclado, identificáveis pelos tons quentes dos pianos elétricos e nos efeitos analógicos dos sintetizadores. Usando de tecnologia discreta (perceptíveis quase que exclusivamente nas programações de bateria), Evelyn gravou mais um álbum em que a expressão retrofuturismo é apta para definição, sem culpa.
O sucesso de lá nem sempre é o sucesso daqui. Conheci o Dead Or Alive na
virada dos 80 pros 90, porque "Come Home With Me Baby" martelava direto
nas FMs. Um tempo depois fui descobrir que o grande hit do grupo
britânico era "You Spin Me Round (Like a Record)"
(1984), primeiro (de vários) número um na parada inglesa produzido pelo
trio Stock, Aitken & Waterman. Não que o som do Dead Or Alive
tivesse algo a ver com o pop pasteurizado do pessoal que estava sob as
asas dos produtores: com a postura extravagante do bom vocalista Pete
Burns na linha de frente, o grupo livrou-se das origens pós-punk/góticas
(Wayne Hussey, do The Mission, fez parte da formação inicial da banda) e
juntou Hi-NRG com synthpop mais a androginia provocante de Burns - algo
entre Alice Cooper e Boy George - pra produzir hits de pista explosivos
como essa "Come Home With Me Baby", confortavelmente inserida em sets
de freestyle e house. Burns empilhou plásticas e polêmicas até falecer
em Outubro de 2016, vítima de um ataque cardíaco.
Só fui conhecer a cantora, atriz e modelo neozelandesa Kimbra em 2012 por causa do multi platinado single "Somebody That I Used to Know", que ela gravou com o belga esquisitão Gotye - um ano antes ela havia debutado com o elogiado Vows. Passei batido. Assim como também nem fiquei sabendo do segundo disco, The Golden Echo, de 2014. Nesse meio tempo, se ouvi alguma coisa da guria, entrou aqui e saiu aqui (aponta os indicadores para as orelhas). Bom, ela acabou de lançar "Like They Do On The TV", o quinto (!) single do seu novo álbum, Primal Heart, que sai no final de Abril. Esse disco não pretendo perder, porque "Like They Do On The TV" me pegou já nos primeiros 30 segundos (fora o que ela é gata).
"Like They Do On The TV": finalmente ela acertou no corte de cabelo.
Chris Glover, a.k.a. Penguin Prison, DJ e produtor americano, vai pra dez anos de carreira e nesse (pouco) tempo enfileirou dois álbuns, vários singles e EPs e uma batelada de remixes (já levou pra mesa de cirurgia gente como Jamiroquai, Ellie Goulding, Goldfrapp, Faithless e Lana Del Rey). Inegavelmente, tem talento. Porque ainda não "aconteceu"? Não sei, coisas do pop. Seu debut autointitulado de 2011 é muito bom (duvido que alguém lembre de alguma coisa desse disco). Bom, ele continua tentando, como mostra seu novo EP Turn It Up. Altos e baixos no mini-disco (que saiu exclusivamente em formato digital). A faixa título é o electropop habitual do artista: bem feitinho, dançável, refrão ganchudo. Tudo parece estar no lugar certo... mas tem uma coisa que não me deixou ouvir mais do que duas ou três vezes a faixa: enjoa fácil. O mesmo vale pra "Keep Coming Alive", a segunda do EP. Já "Do Me Like That" exagera na vibe Grease enquanto bobinha e açucarada. A única música que realmente chama atenção aqui é a Nu-Disco "On Your Side", com uma mão nos vocais da musa-cult-indie-pop Soren Bryce. Espacial e dançável, pop onírico e com o nível de sacarose na medida certa. Aí sim.
Com o novo single "My Name Is Mars", os synthpoppers californianos do Capital Cities vão se candidatando fortemente a um lugar no Hall da Fama dos One Hit Wonders (só que a música em questão não é essa e sim a boa "Safe and Sound", de 2011). "My Name Is Mars" vem sem os onipresentes trompetinhos já ouvidos em outras faixas da dupla. Também vem sem um bom refrão, sem um instrumental que faça a diferença, sem inspiração, sem sal e sem graça. Ano passado saiu o promissor EP Swimming Pool Summer, mas isso aqui é decepcionante. Pra uma banda mais pop do que synth, é grave.
Me senti em 1994. Quatro anos sem disco novo (ano passado ela lançou a ótima "Deadwood" - que está em Sex & Cigarettes, novo álbum da diva R&B que saiu semana passada) e Toni Braxton volta com um single desses. Baita canção. Entre um sussurro e outro e os backing sexy ela solta até os "uh" característicos. Suave e dançável. Ela continua a mesma de 1994. E isso é ótimo.
Com um background que inclui atividades como baterista e dançarino de
break, o austríaco Bernhard Weiss, a.k.a. Demuja, descobriu a discotecagem e
em seguida, a produção de sua própria música, por volta de 2010. Lançando
seus singles por selos como o norueguês Uncut House Records, o americano Nervous Records e o italiano Traxx Underground, em 2016 Demuja criou seu próprio selo, MUJA, por onde saíram três EPs até agora.
Fã de vinil e reclamando para si influências que vão de artistas de house music (Kerri Chandler, Moodymann), jazz (Herbie Hancock, Miles Davis), hip-hop (Mos Def, Wu-Tang Clan) e diretores como Quentin Tarantino, seu lançamento mais recente é o EP Turn Around (realizado no final de Março pela gravadora alemã Toy Tonics) e inclui quatro faixas de house em estado bruto, sem muito polimento. Com samples irreconhecíveis (pra mim, ao menos), timbres macios de teclados e um modus operandi french touch, Turn Around solidifica a promissora carreira de Demuja.
Mais uma faixa especialmente bem feita dos australianos
do Flight Facilities, o novo single "Need You" (com vocais da neozelandesa NÏKA), não deve ir muito além dos pendrives de DJs de
clubes alternativos minúsculos. Entenda: deveria ir longe. É um pop
dançável tão bem acabado que merecia chegar num público realmente
grande. Não me pergunte como. Mas que a música é muito, muito legal, é.
O hilário vídeo de "Need You": Schwarzenegger em algum lugar dos 70, procurando sua cara-metade.
O lendário Todd Terry volta com um single que não é lá nenhuma maravilha em termos de inventividade e originalidade, mas é eficiente o bastante para jogar gasolina na pista dos clubs. "Come On Now" saiu pelo próprio selo de Todd, Inhouse Records e não vai além de algumas variações de synths e o sample-título - mas o bumbo pesa uma tonelada e o baixo tem vida própria. Simples, certeira.
Dia desses fui parar numa página do Youtube que trazia aprimeira canção gravada por Björk, pirralhinha ainda, em algum lugar dos 70. Uma fofura. A música era "I Love To Love", de Tina Charles.
O single da cantora inglesa saiu em 1976, e com a disco a pleno vapor, foi hit fácil no mundo inteiro. Produzida por um dos top produtores da época, o indiano-britânico Appaiah Biddu, "I Love To Love (But My Baby Loves To Dance)" tem um arranjo adocicado de cordas e os agudos impressionantes de Tina Charles (então com tenros 22 aninhos), prontos pra espatifar as vidraças mais próximas.
"I Love To Love": disco britânica infiltrando-se nas paradas.
Na visão oblíqua do locaço DJ Koze, isso é uma dance track. O DJ e produtor alemão (um dos chefões da prestigiada gravadora Pampa Records) convidou a irlandesa Róisín Murphy (ex-cantora do Moloko)
pros vocais de "Illumination" e perpetrou uma das faixas mais
interessantes do período, techno-funky com um loop interminável de
guitarra e baixíssimas frequências sustentando a melodia. Um lançamento
bem ao gosto do seu selo. A canção vai estar em knock knock (assim mesmo, em minúsculas), próximo álbum de Koze, previsto pro começo de Maio.